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Urbanismo Tático x Urbanismo Populista

Diário de Pernambuco - 20 de março de 2020 1124 Visualizações
Zeca Brandão
Arquiteto e urbanista, PhD pela Architectural Association School of London e professor associado da UFPE

Embora a terminologia “Tactical Urbanism” tenha surgido pela primeira vez na literatura especializada em meados dos anos 80, na obra The Practice of Every day life (versão inglesa do livro escrito pelo antropólogo francês Michel de Certeau), o sentido contemporâneo do termo surgiu em 2015, com a publicação do livro “Tactical Urbanism: Short-Term Action, Long-Term Change”, de autoria dos arquitetos norte-americanos Mike Lydon e Tony Garcia. Na esteira do sucesso desse livro, Mike e Tony criaram o escritório “Street Plans Collaborative” e passaram a proferir palestras e desenvolver projetos em vários países do mundo. Em menos de 5 anos, o Urbanismo Tático transformou-se numa das vertentes mais importantes do urbanismo contemporâneo.

Trata-se de um movimento que questiona os grandes projetos em defesa de pequenas intervenções urbanas, rápidas, colaborativas, temporárias e de baixo custo. Os adeptos desse conceito consideram a maioria dos grandes projetos urbanos oficiais equivocados sob o ponto de vista social, econômico e ecológico, e apostam no potencial renovador da ação pontual concebida e executada pela própria população. Sugerem, em outras palavras, uma espécie de resgate da cidade por meio da apropriação interina e gradativa dos seus territórios abandonados, subutilizados ou mesmo mal utilizados.

As estratégias empregadas pelo Urbanismo Tático - também conhecido como Urbanismo de Guerrilha ou Urbanismo Pop-Up - são muitas e podem variar, por exemplo, em termos de escala, orçamento, finalidade, público alvo, impacto, parceria ou temporalidade. Vão desde intervenções de grande porte como a Pedestrianização da Times Square em Nova York, que transformou parte da Avenida Broadway em pequenas praças movimentadas; até micro intervenções como os Parklets: extensões da calçada sobre uma ou duas vagas de estacionamento localizadas em vias públicas, que passam a ser utilizadas como área de convivência para pedestres.

Os aspectos positivos desse modelo de urbanismo são inegáveis. A flexibilidade do formato e sua agilidade de implementação favorecem adaptações para diferentes contextos e retorno imediato dos benefícios, possibilitando assim a pulverização de ações articuladas e a sensação instantânea de melhoria urbana. O maior envolvimento do usuário no processo de produção do espaço urbano reforça também o sentimento de pertencimento e identidade da população, que são premissas básicas no desenvolvimento sustentável de qualquer cidade. Entretanto, na minha opinião, o maior potencial do Urbanismo Tático é a possibilidade de usá-lo como um método barato e objetivo para testar propostas preliminares, antes de tornarem-se projetos definitivos e mais onerosos. Em muitos casos, intervenções provisórias produzidas pelos próprios habitantes, depois de terem os seus impactos avaliados e serem devidamente aperfeiçoadas, poderiam ser executadas pelo poder público através de projetos urbanos oficiais.  

No entanto, o Urbanismo Tático no Brasil tem se caracterizado mais como um instrumento demagógico de gestão urbana do que, propriamente, um hábil e inovador modelo de urbanismo. Por ter baixo custo de implementação, potencial de mobilização popular e capacidade de oferecer melhorias urbanas imediatas, gestores locais têm, por vezes, se beneficiado dessa estratégia para atender provisoriamente à demandas de infraestrutura urbana que requerem soluções efetivas e permanentes. Assim, problemas graves referentes à deficiência da mobilidade urbana, carência de espaços públicos e degradação do meio ambiente vêm sendo enfrentados com ciclovias temporárias, espaços de convivência efêmeros e urbanizações simbólicas de rios e parques. Nesse contexto, precisamos identificar com muita clareza as diferenças entre Urbanismo Tático e Urbanismo Populista, caso contrário, corremos o risco de comprar gato por lebre.