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CONSTRUÇÃO

Soluções Baseadas na Natureza (NBS) e as cidades sustentáveis

- 27 de agosto de 2020 1898 Visualizações
Soluções Baseadas na Natureza (NBS) e as cidades sustentáveis

Pensar nas cidades “para” e “com” as pessoas – é assim que a arquitetura e a engenharia deverão evoluir nos próximos anos. Isso é o que afirmam Paulo Eduardo Fonseca, professor livre-docente da Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da Universidade de São Paulo (FAUUSP), e Beatriz Caetana da Silva, pesquisadora da Universidade de Coimbra, em entrevista ao Engenharia Compartilhada. Este, que sempre foi um dos princípios de ambas as áreas, agora ganha força na Europa e dá origem ao conceito que deve nortear a atuação dos profissionais brasileiros nos próximos anos: Natural Based Solutions - NBS (Soluções Baseadas na Natureza, em português).

O conceito de NBS tem o intuito de, por meio desses profissionais, apresentar soluções que tragam equilíbrio nas comunidades, combinando o bem-estar econômico, ambiental e social – sem priorizar um ou o outro – e, geralmente, é aplicado para resolver demandas de recursos hídricos, cadeias produtivas e, em entre outras, a de melhoria da gestão municipal.

Em todos os casos, para que essas soluções sejam criadas é preciso mais do que apenas tecnologia e conhecimento, itens que temos “de sobra” segundo os especialistas. Para eles, o desenvolvimento de cidades eficientes e sustentáveis economicamente, ambientalmente e socialmente, passa pela união entre os gestores públicos, população local, engenheiros e arquitetos. “Não há como falarmos de futuro sem entendermos a forma como as pessoas querem esse futuro”, comenta Fonseca. “Podemos desenvolver soluções para a infraestrutura das cidades, mas para que os resultados sejam efetivos, precisamos colocar o NBS em prática e isso, consequentemente, envolve permitir que a população co-governe o local onde mora. Assim, tornamos as cidades eco eficientes e socialmente mais justas”, complementa.

Na prática

Para esclarecer como o conceito de SBN atrelado à co-governança pode ser aplicado na prática, Beatriz cita o Urbinat (https://urbinat.eu/), projeto da Universidade de Coimbra, do qual a pesquisadora participa.

O projeto, que começou a ser implantado em 2019 e segue em testes em 2020, foca na regeneração de bairros de habitação social existentes em sete cidades europeias: Porto (Portugal), Nantes (França) e Sofia (Bulgária), Siena (Itália), Nova Gorica (Eslovênia), Bruxelas (Bélgica) e Høje-Taastrup (Dinamarca). Cada uma das cidades funciona como um laboratório vivo para a criação e implementação de soluções baseadas na natureza que reforcem a relação entre a população e os domínios de energia, água, alimentação, natureza, mobilidade, democracia digital etc. No caso de Porto, o primeiro movimento do projeto foi envolver a comunidade por meio de palestras e workshops realizados em escolas públicas nos bairros de interesse.

Em paralelo com a mobilização popular, o Urbinat buscou construir um percurso que ligasse os bairros periféricos à região central dessas cidades por meio de pequenos jardins, hortas e outras iniciativas que, além de contribuírem com o meio ambiente, também traziam benefícios à cidade em si – atraindo visitantes e turistas, por exemplo - e uniam a população na concepção e implementação desses locais.

Outra vantagem desse modelo é que, ao participar da criação de locais como estes, os próprios moradores das regiões passam a fiscalizá-los e prezar pela manutenção dos mesmos. “Em particular, propõe-se promover ações que considerem a inclusão de grupos excluídos, tais como mulheres, idosos e a população em condição mais vulnerável. Se, por um lado, a degradação urbana é uma realidade em muitos contextos, em particular nas zonas densamente povoadas, por outro, nessas mesmas áreas, encontramos um forte potencial de organização social, apoiado em laços de solidariedade e de compromisso”, diz Beatriz.

No Brasil, iniciativas menores com o mesmo conceito vêm sendo realizadas aos poucos. O Centro de Estudos de Sustentabilidade da FGV (Fundação Getúlio Vargas) publicou, em 2017, os primeiros casos conhecidos de projetos de infraestrutura com soluções baseadas na natureza no país (você pode acessar o relatório, clicando aqui: http://www.gvces.com.br/p22_on-solucoes-baseadas-na-natureza-sbn?locale=pt-br).

Em Campinas, cidade do interior de São Paulo, por exemplo, um projeto mapeou 49 trechos de parques para a implementação de áreas verdes sociais, que devem ser construídas em até 20 anos. O objetivo é aumentar a resiliência da cidade frente a mudanças climáticas, melhorar a qualidade do ar, instalar equipamentos de esporte e lazer e estimular a prática de atividades físicas. Também haveria ganhos para o saneamento da cidade, entendendo-se que com os parques construídos às margens de rios os protegeriam de serem vistos como possíveis pontos de descarte de lixo e esgoto pela população.

Os desafios para as novas relações no uso do espaço público

Apesar de tendência, a aplicação do conceito de NBS e, principalmente, do princípio de co-governança ainda possui alguns desafios a serem enfrentados. Tanto na opinião de Fonseca quanto na de Beatriz, um dos maiores gargalos está em comprometer os governos a adotarem mecanismos efetivos na criação da co-governança. “Não estamos falando de submeter projetos e impô-los à população como vemos em muitos casos. É preciso despertar o interesse do povo por aquele problema, criar um relacionamento e deixa-lo opinar e aplicar a solução”, reforça Fonseca.

Beatriz reforça ainda o papel dos arquitetos nesse contexto. Ela ressalta que os profissionais possuem grande influência na tomada de decisão em possíveis projetos sustentáveis, pois são eles quem detém o conhecimento técnico. “ Quanto maior for o compromisso destes com cidades mais sustentáveis e socialmente justas, maior será a probabilidade de mudanças concretas”, diz ela.