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Crise no abastecimento do aço afeta as entregas de máquinas e equipamentos

Petronotícias - 09 de outubro de 2020 1380 Visualizações
Crise no abastecimento do aço afeta as entregas de máquinas e equipamentos

A crise no abastecimento do aço e os altos reajustes do produto reverberam em toda a indústria brasileira. O Petronotícias vem acompanhando e divulgando os efeitos desse desarranjo ao longo das últimas semanas. Hoje (8), vamos ouvir quem vive o dia a dia do mercado e está sentindo na pele os desdobramentos da falta do aço e dos aumentos no preço do insumo. O nosso entrevistado desta quinta-feira é o consultor da Associação Brasileira da Indústria de Máquinas e Equipamentos (Abimaq), Homero Dornelles. Conhecer os efeitos da crise dentro desse segmento é importante, pois produz as máquinas necessárias para confeccionar os produtos finais consumidos pelos brasileiros. Qualquer problema no setor pode desencadear um efeito dominó. Dornelles compara a situação atual a um iceberg. O que vemos agora, isto é, o desabastecimento de aço, é apenas a ponta. Os perigos maiores estão submersos nas águas. Caso nada seja feito para reverter esse cenário, as consequências podem ser graves para o segmento de máquinas e equipamentos: “Vamos deixar de cumprir com nossos clientes, teremos fábricas paradas e ainda existirá um ônus imensurável de custos”, alertou. O consultor da Abimaq também explica que o preço acordado em fevereiro ou março para venda de máquinas não consegue mais ser cumprido por conta do aumento no valor do aço, que interfere entre 30% e 50% do custo desses equipamentos.

Primeiro, eu gostaria que comentasse como o setor de máquinas e equipamentos está sentindo os efeitos desse desordenamento no fornecimento de aço.
Nós estamos enfrentando um grave problema de abastecimento e uma elevação de preços acima de qualquer patamar imaginável. Isto porque, seja pelo efeito da pandemia, pela alta do dólar ou pelo preço do minério de ferro, estamos em um desequilíbrio do mercado.

Este desequilíbrio fez com que o Brasil parasse por um determinado tempo. A atividade industrial reduziu significativamente [no início da pandemia]. Por sua vez, a siderurgia adequou sua produção à demanda que havia sido sinalizada pelos seus clientes. Contudo, a retomada do setor industrial veio de uma forma muito elevada. Só que a siderurgia não acompanhou essa necessidade oriunda do setor de máquinas e equipamentos.

Esse desarranjo no fornecimento de aço pode trazer quais consequências para o setor de máquinas e equipamentos até o final do ano?
As consequências são muito graves. O setor de máquinas e equipamentos “produz para a produção”. Antes da fabricação de um item final, como um eletrodoméstico, por exemplo, existe a produção de uma máquina usada na confecção daquele item.

As nossas encomendas foram suspensas por um determinado tempo, mas agora estão sendo cobradas novamente. Nós estamos produzindo o item com um preço fechado, mas com dificuldade de cumprir o prazo de entrega, porque o abastecimento não está acontecendo.

Vou citar três pontos críticos para a indústria de máquinas e equipamentos. O primeiro é o desabastecimento [de aço], que provoca atraso nas entregas e descumprimento de contratos. O segundo ponto é uma redução da atividade produtiva por falta de abastecimento de matéria-prima, como o aço. E em terceiro é o prejuízo em função dos aumentos que estão acontecendo. O preço acordado na hora da venda, em fevereiro ou março, não consegue mais ser cumprido por conta do aumento de 60% no aço, que interfere entre 30% e 50% do custo do nosso produto.

Tendo em vista essas primeiras considerações, poderia falar como esse cenário atual pode atrapalhar a retomada do setor de máquinas e equipamentos?
Eu entendo que, mantida a condição atual, haverá um freio significativo que só vamos conseguir corrigir em janeiro/fevereiro do ano que vem, tendo em vista a sinalização de abastecimento que temos visto no setor siderúrgico.

Eu gosto de usar a figura do iceberg [para ilustrar a situação atual]. A ponta desse iceberg é a falta de abastecimento, por conta do desligamento dos altos-fornos em março e abril. Mas o que há embaixo dessa linha do horizonte? Há toda uma compra de aço que foi feita junto às usinas brasileiras, em função da dificuldade do embarque da exportação do aço da China. A falta desse material chinês fez com que setores, que compravam de usinas do exterior, buscassem o aço no mercado interno.

Por outro lado, o mercado interno passou a exportar mais placas de aço. Resultado: ocorreu o desabastecimento de matéria-prima. E hoje estão com dificuldade de fazer a laminação. A minha leitura é que precisamos de uma solução trabalhada em conjunto pela siderurgia e os clientes de produtos siderúrgicos.

Então, sob a perspectiva da indústria de máquinas e equipamentos, o que pode ser feito para enfrentar esse cenário de desabastecimento?
Na alternativa de pedir reajuste de preço [das máquinas e equipamentos], nem sempre o cliente está disposto a pagar. Existem contratos que devem ser cumpridos e, muitas vezes, com dificuldades de realizar uma renegociação daquilo que já foi encomendado.

Já no caso de atrasar a entrega, muitas vezes você vai incorrer em custos até para o próprio cliente. Em alguns casos, pode acontecer que esses clientes já tenham desenvolvido toda a parte civil de suas fábricas e, agora, não conseguem receber os equipamentos.

O que se poderia fazer, em ações integradas, é buscar privilegiar a indústria nacional [com a entrega de aço] para minimizar o efeito do desabastecimento.

O setor de máquinas e equipamentos tem uma previsão de quando essa situação de abastecimento deve melhorar?
Eu gostaria que a siderurgia nos desse essa resposta… O que os nossos fornecedores de aço anunciam é que a regularização estaria prevista para o próximo ano, em janeiro e fevereiro. E isso não nos atende.

Por quê?
Porque vamos deixar de cumprir com nossos clientes, teremos fábricas paradas e ainda existirá um ônus imensurável de custos.

O senhor acredita que o Brasil deve revisar suas políticas de abastecimento de matérias-primas?
A Covid-19 colocou em xeque todo o modelo de desenvolvimento que estava sendo implantado até o momento. No passado, houve uma migração de atividades industriais – indesejáveis ou não – para a China, que passou a ser a grande fornecedora do mundo. Mas na hora que a China passou a enfrentar dificuldades de produção e expedição, o mundo se viu diante de uma situação adversa. Hoje, já existe o questionamento sobre essa postura de transferir para um único país o fornecimento de matérias-primas e itens essenciais.

Esse ponto que o senhor levantou em sua última resposta também se aplica ao aço, correto?
Sim. De certa forma, o Brasil exporta uma quantidade muito grande de minério, ao invés de produzir [aço] internamente. O país deveria privilegiar a produção interna, de tal forma a atender a demanda interna e ter competitividade para abastecer o ambiente externo.